O ano de 2024 será, ao que tudo indica, de retoma do poder de compra para os contribuintes portugueses. Com uma inflação média anual nos 4,3%, segundo revelou o INE, esta inflação está abaixo dos 7,8% de 2022 e dá perspetivas positivas para o novo ano. Mas nem todos os sinais são positivos, porque vai acabar em janeiro o IVA Zero nos alimentos, e continuará a haver uma escalada de preços em produtos e serviços como as telecomunicações.
Será que o aumento de salários, a baixa do IRS até ao 5º escalão, e a diminuição das retenções na fonte vão ser a bolha de oxigénio para os portugueses? Fazemos uma retrospetiva do que pode esperar de 2024 em termos de custos e do rendimento disponível, dando-lhe nota das principais medidas e acontecimentos financeiros do ano.
Aumentos na Função Pública entre 3% e 6,84%
A trabalhadores do Estado darão o exemplo do que o universo de assalariados portugueses poderá esperar deste ano. Em 2024 haverá um aumento decretado de 3% e 6,84%, o que arrancará um ciclo de valorizações salariais também acordadas para o setor público.
O diploma aprovado em novembro de 2023 coloca agora os salários da Função Pública nos 821,83 euros, ou seja, haverá um aumento de 52,63 euros para quem receba até 1.754,49 euros. E um aumento de 3% para quem ganhe mais do que este patamar máximo.
Em relação ao salário mínimo, o setor público terá remunerações de referência 1,8 euros superiores. O custo para o erário público que suportará este aumento de salários fixa-se nos 847 milhões, o que, comparativamente, fica acima da despesa para a construção da linha do TGV Lisboa-Porto. O peso é significativo, ainda mais porque os funcionários terão uma atualização nas tabelas de retenção da fonte de IRS.
Aumento do salário mínimo para 820 euros
Tal como foi acordado em sede de concertação social e junto das confederações patronais, o governo conseguiu impor uma subida histórica do salário mínimo. Ele passa de 760 euros para 820 euros, o que é o maior aumento em Portugal.
No que respeita à atualização de salários no setor privado, ficou acordado um referencial de 5% para as atualizações durante 2024. Este acordo é meramente indicativo e voluntário, pelo que pode não ser seguido pelas empresas, ainda que o patronato tenha mostrado interesse em seguir a indicação. O objetivo é reforçar rendimentos, a competitividade e enfrentar o aumento do custo de vida dos portugueses.
É de notar ainda que os trabalhadores a recibos verdes, ou seja os trabalhadores por conta própria, terão de se ajustar a qualquer que seja a realidade laboral que lhes seja imposta. Esta área de atividade não está sujeita regulação salarial, pelo que será o mercado, a competição e a capacidade de negociação individual a ditar a realidade do aumento de salários.
Menos impostos em IRS e Retenção na Fonte
O esforço nas contribuições de impostos em IRS vai baixar no novo ano. Os escalões serão atualizados em 3%, as taxas até ao quinto escalão vão baixar, e as tabelas de retenção na fonte vão exigir menos de quem tem menos. Ou seja, trabalhadores de baixos rendimentos e pensionistas terão mais dinheiro disponível ao fim do mês a partir de 2024.
Agora, só salários a partir de 820 euros (o salário mínimo) é que fazem retenção de IRS, o que se estima que represente um ganho de 28 euros para salários baixos. Além disso, salários até 1.300 euros também pagarão menos em IRS. Vamos a algumas contas:
- Um salário bruto de 900 euros para um solteiro com um dependente, terá um alívio de 21 euros mensais. Isso representa 84% de desconto.
- Um salário bruto de 2.000 euros para um trabalhador casado com um dependente, terá um alívio de 56 euros. Ou seja, um desconto de 15%.
Vejamos também o que acontece aos rendimentos dos pensionistas com as novas regras do IRS:
- Um pensionista que ganhe 900 euros e que não esteja casado, vai ter uma redução na fonte de 49%. Ou seja, verá o seu rendimento líquido aumentar em 25 euros.
Pensões
Depois de vários anos congeladas, as reformas vão finalmente crescer acima da inflação, entre os 5% e os 6%. Prevê-se que os aumentos venham a beneficiar um universo de 2.7 milhões de pensionistas.
Assim, pensões até 1.018,52 euros terão aumentos de 6%. As reformas entre este valor e os 3.055,56 euros terão aumentos de 5,65%. E reformas acima deste patamar têm aumentos de 5%.
Para a atualização de pensões será aplicada a fórmula de cálculo que existe na lei portuguesa, e que considera tanto a inflação como o crescimento do PIB para manter o poder de compra dos pensionistas. Esta novidade sobre os aumentos para os pensionistas só se tornou efetiva em dezembro de 2023, estando os pagamentos a cargo da Segurança Social e da Caixa Geral de Aposentações. Os aumentos serão automáticos e imediatos.
De notar ainda que em 2024 será mantido o acesso à idade de reforma nos 66 anos e quatro meses. Deve-se a isso o recuo na esperança média de vida que se associa à pandemia de covid-19 que assolou recentemente o globo. Em 2025, a idade de acesso à reforça retomará o ritmo de crescimento, passando para os 66 anos e sete meses.
Aumento de preços nos transportes
Há vários casos de aumento de preços nos transportes. A Comboios de Portugal já divulgou uma nova tabela de preços para compra de bilhetes, ainda que os passes mensais mantenham o seu valor. Os aumentos que pudemos observar estão nos seguintes serviços:
- Viagens de Alfa Pendular e Celta – aumentos na ordem dos 6% nos bilhetes.
- Assim, uma viagem entre Lisboa e Porto passará de 31,90 euros para 33,90 euros.
Também a Fertagus vai aumentar os preços dos bilhetes na ordem dos 6,43%. E no caso do metro de Lisboa, os bilhetes individuais vão ter um agravamento entre os 14 e os 20 cêntimos.
Já a Carris, a empresa de autocarros que serve a Área Metropolitana de Lisboa, terá um agravamento de dez cêntimos. A Transtejo, empresa de navegação por cacilheiro e catamarã, terá um agravamento de 10 cêntimos. E, no Porto, os autocarros STCP ainda não teve aumentos anunciados.
De notar que o governo mantém congelados os preços dos passes mensais sociais para circular na Área Metropolitana de Lisboa e do Porto. Ou seja, 30 euros para passes municipais, e 40 euros para passes metropolitanos (havendo descontos significativos para pensionistas).
Telecomunicações
Em breve haverá um player novo em Portugal, a Digi, que promete atacar a subida de preços fazendo uma pressão significativa para descontos nas faturas a pagar. Ainda assim, e o que é conhecido para já, é que os principais operadores de telecomunicações vão aumentar preços em linha com a inflação.
Assim, é de esperar que tanto a Meo, NOS e Vodafone atualizem preços (a partir de fevereiro) na ordem dos 4,6%. Mas alguns serviços específicos também vão aumentar, por exemplo, a Meo aumentou já as mensalidades dos serviços pós-pagos em 0,50€.
Os argumentos para este agravamento de custos têm a ver com “investir num serviço de qualidade”, e o “contexto inflacionista”. Ou seja, as operadoras vão cavalgar a onda inflacionista para justificar aumentos.
Lembramos que tanto a Nowo como a Digi são operadoras low cost que poderão acumular novos clientes e baixar o ritmo de aumentos no setor.
Custos da eletricidade e gás
De acordo com a Entidade Reguladora dos Serviços Energéticos, a ERSE, o custo da eletricidade vai aumentar em 3,7% no mercado regulado. Por exemplo, com uma potência de 3,45 kVa, e com um consumo médio de 1.900 kWh por ano, o custo suplementar seria de 1,05 euros mais na conta da luz.
Em relação ao mercado liberalizado, a EDP Comercial já disse que os custos da energia irão baixar em 21% face às condições do mercado. Mas não antecipou quais serão as novas tarifas, pelo que é difícil dizer se o mercado liberalizado passará a ser mais vantajoso que o regulado.
No que respeita ao gás natural, não estão previstos aumentos de preços para este ano.
Rendas mais caras
O novo coeficiente de atualização de rendas permite aos senhorios aumentarem o valor cobrado em 6,94%. Esta é a atualização mais elevada de 1994, pelo que surtirá num agravamento e num peso significativo para os arrendatários, principalmente entre quem já paga valores elevados por viver em regiões como a cidade de Lisboa.
A subida no valor das redes poderá ser atenuada com o anúncio simultâneo de apoios ao pagamento de rendas e com as novas regras para contratos novos de arrendamento. Os novos contratos ficam impedidos de subir as rendas em mais de 2%. Também foi reforçada a medida Porta 65 Jovem, que financia rendas a preços acessíveis.
Preço dos alimentos
Como referimos, vai acabar a medida do IVA zero, que implementada em 2024 para fazer frente ao aumento generalizado dos custos energéticos. Isso irá trazer uma subida generalizada no preço dos alimentos. Outros fatores como o encarecimento das matérias-primas ou os problemas em recrutar mão de obra também poderão ter efeitos nos preços de vendas de alguns produtos, como o azeite ou o pão.