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As eleições legislativas de 10 de março em Portugal foram, como se esperava, muito difíceis para o líder socialista Pedro Nuno Santos. Ele não conseguiu defender o legado de António Costa e expor caminhos de futuro de forma convincente. Ainda assim, perdeu as eleições por muito pouco, tendo elegido 77 deputados (resultado de 28,66%) contra os 79 deputados da AD (29,49%).

O mais surpreendente foi o facto de o líder da ultradireita populista em Portugal, André Ventura, ter conseguido impulsionar o partido CHEGA para a terceira posição do hemiciclo. Elegeu 48 deputados (18,06%). À esquerda, boas notícias só mesmo para o Livre, que quadruplicou a votação e conseguiu eleger quatro deputados (3,26%).

Agora, o governo minoritário da AD (que junta PSD a CDS e PPM) terá a incumbência de negociar orçamentos de Estado com as várias forças parlamentares e de governar o país. Uma tarefa que será da maior dificuldade. E que deixará o país numa constante situação de suspense político.

Aliança Democrática ganha ao Partido Socialista por margem mínima

A vitória de pirro da Aliança Democrática (28,66%) e o colamento do Partido Socialista nesse patamar (29,49%) representam a diluição do centro político em Portugal. Que desde sempre tem dominado a política portuguesa. Juntos não chegam aos 60%, quando há dois anos somavam 85%. Devemos também olhar para os níveis de abstenção historicamente baixos, com apenas 33,77% nestas eleições.

O que isto significa é que houve uma corrida dos portugueses às mesas de voto. Mas muitos deles depositaram o seu voto em partidos de protesto, com especial enfoque no CHEGA.

Agora, para a AD formar governo, o presidente Marcelo Rebelo de Sousa terá de convidar Luís Montenegro a iniciar diálogos com as várias forças políticas de modo a assumir o seu governo minoritário. Poderá ser uma tarefa inglória para Luís Montenegro, que preferiria estar no lugar mais recatado da oposição.

Cenários de governabilidade para Luís Montenegro: Aliança com o Chega ou governo minoritário a prazo?

O novo ciclo político que agora se inicia em Portugal trará dores de cabeça a Luís Montenegro. Ele tem uma tarefa colossal em cima dos ombros. Com a ultradireita a pressionar acordos de coligação e algumas vozes dentro do PSD a quererem exatamente isso, Montenegro deverá refletir sobre o seu futuro político e do seu partido.

Ao aceitar um acordo de coligação com o Chega, Luís Montenegro poderá usar o argumento de que ouviu o povo nestas eleições. E apaziguará algumas vozes dissidentes internas ao seu partido que querem maiores garantias de governabilidade. A maioria, ainda assim, acredita que o Chega não é um partido fiável, coerente, ou sequer democrático. Pelo que uma coligação poderia ser um presente envenenado.

Para ser coerente com a sua palavra, que disse que “não é não” quanto a entendimentos com o Chega, Luís Montenegro deverá com toda a probabilidade assumir um governo minoritário. Mas, para isso, terá de promover políticas que agradem principalmente ao PS, e ainda há muito caminho que podem certamente percorrer em conjunto.

Como governará Luís Montenegro com acordos junto do PS?

Montenegro não deverá governar em coligação nem sequer com acordos de incidência parlamentar – ao estilo de um Bloco Central. Em vez disso, assumirá a posição muito frágil de criar um programa de governo costurado à medida do PS e que promova os mínimos olímpicos de governabilidade com a concordância da esquerda e também com o Chega.

Algumas das medidas do programa da AD que poderão permitir a aprovação do primeiro Orçamento de Estado:

  • Diminuição dos impostos do trabalho para os escalões mais baixos. Note-se que avançar com a medida eleitoral de baixa generalizada e indiscriminada dos impostos poderá levar ao chumbo da Esquerda parlamentar (mas não necessariamente do Chega). Isto porque o principal efeito seria baixar impostos para os que têm rendimentos mais elevados.
  • Continuar com o ritmo de aumento do salário mínimo. Esta medida é fundamental para a esquerda parlamentar, que aprovaria essa iniciativa.
  • Recuperar o tempo de serviço dos professores. Uma vez mais, esta é uma medida importante para a Esquerda, porém o ritmo de devolução do tempo de serviço poderá determinar o apoio ou não à medida.
  • Aprovação de matérias de liberdade individual, como a eutanásia. Esta medida é muito controversa dentro do PSD e do próprio Chega, que tem um eleitorado conservador e até religioso. Assim, não é de esperar que esta medida venha a surgir para o primeiro OE.

O que aconteceu ao Chega, o partido de ultradireita e antidemocrático que todos temiam mas que cresceu como nenhum outro?

O grande vencedor da noite eleitoral foi o Chega, que se afirmou como a terceira força na Assembleia da República e foi alavancado por um crescimento exponencial. O partido passou de 7,15% e 12 deputados, nas últimas eleições de 2022, para 18,06% e 48 deputados agora. Isto significa que a bancada parlamentar de André Ventura é multiplicada por quatro, e o Chega ganhará um papel determinante para o funcionamento da Assembleia da República.

Vários concelhos do país foram conquistados por esta força política de protesto, além de que foi o partido com mais votação no distrito de Faro. O seu efeito foi também o de romper com o tradicional bipartidarismo em Portugal, assumindo-se como partido médio e que é capaz de pautar as atividades na AR e o debate público.

O Chega é o único partido de matriz populista e neoliberal no parlamento, apesar de o partido Iniciativa Liberal se posicionar também à direita e com um discurso de privatizações e descapitalização do Estado Social. A diferença é que a IL procura ser moderado, dialogante e de sistema, o que talvez tenha alienado parte do eleitorado descontente, mantendo assim os oito mandatos e um resultado semelhante ao das últimas eleições (agora 5,08%, contra 4,98% há duas eleições).

O que aconteceu à Esquerda nestas eleições?

A direita parlamentar não tem maioria para governar se todos quiserem fazer a chamada “cerca sanitária ao Chega”, recusando diálogos que normalizem este partido antidemocrático. Mas a Esquerda também não permite a reedição da chamada “Geringonça”, não conseguindo governar sozinha.

O Partido Socialista de Pedro Nuno Santos desceu de uma votação de 41,68% em 2022 (122 deputados) para 28,66% e 77 deputados agora. É pouco, mas o suficiente para permitir a manutenção de Pedro Nuno Santos com o líder do partido. O que não permite é efetuar uma geometria à esquerda que sirva de alternativa de governação, passando estes partidos a assumir a posição de oposição à direita no Parlamento.

Só o Livre conseguiu crescer de forma assinalável, assegurando 2,84% dos votos e quatro deputados, o que contrasta com os 1,28% obtidos nas últimas eleições. Com este resultado, o Livre assegura um grupo parlamentar na AR, onde, além de Rui Tavares, entrará Isabel Mendes Lopes, Jorge Pinto e Paulo Muacho.

A quinta força política na AR será o Bloco de Esquerda, que conquistou 4,46% dos votos e manteve os mesmos cinco deputados da sua bancada. Pode-se dizer que há um perdedor, a CDU, que de 4,39% e seis deputados em 2022 desceu para 3,30% e três deputados nestas eleições. Isso obrigará a uma profunda reflexão ao nível do Comité Central do PCP e da própria liderança de Paulo Raimundo se quiserem inverter esta diluição cada vez mais acentuada deste partido histórico português.

Já o PAN, que todos anteviam que tivesse vida difícil nestas eleições, até conseguiu subir ligeiramente a votação de 1, 58% para 1,92% dos votos, ficando aquém da eleição de mais deputados. Mantém-se assim com a sua deputada única Inês de Sousa Real, conquistando pelo menos um dos seus objetivos eleitorais.

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