É difícil dizer certas coisas preto no branco. Mas, depois do divórcio da Comissão Europeia relativamente à Gazprom russa, agora sobra a Equinor como a principal fornecedora de gás para a Europa. Esta empresa norueguesa assume praticamente um papel de monopólio neste setor. O que volta a colocar a Europa e os consumidores europeus em maus lençóis se houver decisões políticas erradas no futuro.
A Equipor ASA não é, contudo, a única fonte de abastecimento dos consumidores europeus. Consumidores, aliás, que querem ver o mercado diversificar-se para evitar riscos sistémicos como aconteceu recentemente com a Rússia.
O que aconteceu à norueguesa Equipor desde que a invasão russa obrigou ao corte de abastecimento da Gazprom?
Passaram-se mais de dois anos desde que a Rússia invadiu a Ucrânia. E lançou a Europa numa espiral de decisões difíceis que provocaram inflação histórica e degradação do custo de vida de todos os europeus. O pior foi o facto de o corte de relações com a Rússia ter feito disparar o preço da energia. Com efeitos muitos significativos no preço dos alimentos e das cadeias de abastecimento globais.
Agora, há uma empresa de petróleo e de gás norueguesa que está a ocupar o antigo posto da Gazprom. Não só isso, como também parece estar a chegar a uma posição de monopólio. A Equipor, empresa norueguesa de energia, já fornece 30% de todo o gás que a Europa consome. Podemos comparar com os 35% que eram anteriormente a cota da Rússia para a Europa antes da invasão da Ucrânia estalar.
Além disso, atendendo aos mais de 109 biliões de metros cúbicos de gás exportados importados pela Europa em 2023 para fazer face aos seus consumos domésticos, profissionais e industriais, mais de dois terços parecem ter sido garantidos pela empresa de gás norueguesa.
Ainda que as orientações estratégicas do bloco europeu pretendam privilegiar as fontes de energia renováveis, a verdade é que a dependência das energias fósseis ainda obriga a compras estratégicas de larga escala sob pena de paralisar as economias e a vida das pessoas. É por isso que os hidrocarbonetos noruegueses são hoje mais essenciais do que nunca na Europa.
Quais os principais fornecedores de gás para a Europa em 2023?
A relação de forças entre os principais fornecedores de gás tem-se vindo a alterar desde a guerra na Ucrânia, ainda que a Rússia mantenha uma posição relevante. De acordo com a Comissão Europeia, os principais países fornecedores são hoje:
- A Noruega, com 30,3% de todo o gás consumido a ter esta proveniência.
- Os Estados Unidos, com uma cota de 19,4%.
- A Rússia (impossível cortar relações), com uma cota de 14,8%.
- O Norte de África, com uma cota de 14,1%.
- Outros países, com 10,3%.
- O Reino Unido, com 5,7%.
- O Catar, com 5,3%.
A aposta no gás num tempo de renováveis e de energias limpas
A Europa quer atingir uma meta de neutralidade carbónica e evitar o aumento da temperatura média do planeta numa altura de crise existencial para a humanidade. Porém, essas metas ambientais que são reiteradamente assinadas nas cimeiras globais do clima parecem pouco realistas quando vemos a dependência crescente em energia fóssil.
Poderíamos mesmo dizer que ao invés de uma transição energética na Europa, estamos a assistir a uma expansão energética, em que fontes fósseis convivem com fontes renováveis.
É por isso que uma empresa como a norueguesa Equipor está também a ganhar um papel preponderante na relação de forças com a Europa. Esta empresa sediada na Europa parece ser a mais relevante no que respeita ao abastecimento de fontes de energia “convencionais”, numa altura de expansão em que os interesses geopolíticos se estão a reformular. E isso deve-se, claro, ao lobby energético e de empresas ligadas à indústria e ao comércio que tratarão de travar qualquer intenção de transição verde, como se diz.
O preço do gás subiu e não se prevê que isso recue
Desde a cisão com a Rússia que o preço do gás tem vindo a subir, impulsionado pela especulação dos fornecedores e dos mercados financeiros, mas também porque produzir e fornecer gás a partir da Noruega fica mais caro.
Nunca como hoje as críticas dos consumidores mas também dos idealistas que querem um futuro verde para a Europa e para o mundo foram tão audíveis. Relembramos que Macron cunhou o ativismo ambiental como “extremismo” e até “terrorismo verde”. Mas há, simultaneamente, uma massa de trabalhadores europeus descontentes com o custo crescente dos seus modos de vida, muito devido ao problema dos preços da energia.
A Noruega não é um Estado Membro da Europa e, com a sua nova posição preponderante na relação com o continente europeu, pode também reafirmar a sua visão de que sem gás não haverá transição energética.
Foi no final de abril passado que o chanceler alemão Olaf Scholz agradeceu publicamente à noruega por ter tornado o continente europeu livre do gás russo “em poucos meses”. Referiu também a “parceria perfeita” que garantiu o fornecimento da Europa e da Alemanha. Isto revela que o que era um problema russo poderá agora ser um problema norueguês, no sentido em que a Europa nunca se irá ver livre das energias fósseis, por muitos objetivos de transição energética que estabeleça.
Lucros da Noruega com o fornecimento de gás à Europa
O novo papel da Noruega como principal fornecedor de gás à Europa tem enchido os cofres daquele país como não há memória. As exportações de gás atingiram um recorde de cerca de $139 biliões em 2022, o que demonstra que não há qualquer incentivo a que se pare com a exploração e fornecimento desta matéria-prima.
O país adota uma estratégia reveladora de um mundo que está não em transição energética mas em expansão energética, comandado sempre pelas leis do mercado. A Noruega lidera, por exemplo, iniciativas na investigação e desenvolvimento de soluções para a indústria dos veículos elétricos. E ainda que isso pareça ser um contributo importante para a crise climática que se abate sobre o planeta, a verdade é que as práticas energéticas do bloco europeu e dos seus países parceiros são contraditórias.
A situação energética da Europa em 2024 e no futuro próximo
É inegável que a Europa está numa posição muito melhor do que encontrava há apenas um ano, ainda que as suas circunstâncias permaneçam incertas. Basta uma nova crise geopolítica ou diplomática para o fornecimento de combustíveis fósseis voltar a sofrer disrupções para os mercados darem a sua ajuda no aumento dos preços.
Em particular no que respeita à especulação em bolsa, as apostas altamente especulativas podem levar as empresas fornecedoras a reduzir a produção de gás e petróleo. O que, em consequência, trará um aumento de preços ao consumidor final.
O que se antecipa agora é que o fornecimento de gás natural da Noruega volte a atingir novos máximos este ano, reforçando a sua cota de mercado. A Equinor tem vindo a trabalhar para melhorar a sua capacidade de exploração e fornecimento. É o ministro da energia Norueguês, Terje Assland, que o diz como ninguém: “[a Noruega] vai-se tornar num fornecedor estável e de longo prazo de energia” por muitas mais décadas.
E o tema da transição verde e da autossuficiência e independência Europeia? Esse tema poderá revelar-se, mais uma vez, pura retória sem consequências para um futuro que se desejaria mais sustentável.