A expressão “flexibilidade” vai entrar cada vez mais em uso no mundo do trabalho, com as primeiras propostas de pagamento de salários associados à produtividade a serem debatidas pela Iniciativa Liberal. Esta medida não é de todo consensual no espaço político português. Mas já faz escola na Europa e quer ser uma medida estratégica a aliar a outras como o pagamento de remunerações em períodos fiscais mais flexíveis.
Hoje em dia, em setores que vão do retalho à indústria, já há várias empresas que fazem a transferência do salário quando o trabalhador quer. As vantagens também são evidentes. Permite responder a necessidades de liquidez do trabalhador, e fazer uma gestão financeira mais personalizada.
Damos-lhe as últimas notícias do que se está a passar em Portugal e no mundo relativamente a esta nova tendência de pagamentos mais flexíveis. Normas que nos aproximam da lógica do trabalhador liberal.
O que é o rendimento associado à produtividade?
Esta é uma das bandeiras que a Iniciativa Liberal veio trazer ao debate das legislativas que estamos a ter em Portugal. Com um bom resultado e uma maioria de direita no próximo dia 10 de março, é possível que uma maior flexibilidade no pagamento de bónus e subvenções se venha a instalar. O objetivo é promover a produtividade e uma ideia de meritocracia, que vai além do pagamento normal de salários mensais.
O que isto quer dizer é que em certas áreas-chave nas quais a produtividade é uma métrica de valor quantificável faz sentido implementar sistemas bonificados de salário. Por exemplo, na área do turismo, na qual um maior número de turistas corresponde a maior produtividade,
A ideia foi apresentada no contexto do setor público. Quando se fala nomeadamente dos médicos ou da carreira docente. Mas poderia ser estendida a mais áreas.
Se acredita com um salário variável e dependente da atribuição de bónus mensais pode ser um fator de motivação e de promoção da produtividade numa empresa. Então, esta é uma tendência a considerar!
O que é o pagamento de salário em períodos flexíveis?
Imaginemos que os nossos trabalhadores são jovens, dinâmicos, e se envolvem em vários tipos de investimentos. Seja a contrair um crédito à habitação, investindo na bolsa, ou criando um projeto empresarial nos tempos livres. Nestes casos, em que há uma força de trabalho dinâmica e com projetos extra-laborais, por vezes surgem necessidades de liquidez.
Ao se colocar a necessidade de liquidez a meio de um mês, passa a ser possível pedir a antecipação do salário em associação ao tempo efetivamente de trabalho. Os dias laborais são assim pagos sem burocracias nem complicações, libertando dinheiro para o trabalhador quando ele pretender. E, em consequência, gerando mais felicidade e segurança no trabalho. Esta medida pode soar estranha, mas já está em vigor em Portugal.
A famosa rede de padarias lisboeta Gleba é um desses exemplos de pagamentos flexíveis aos trabalhadores. E está longe de ser caso único em Portugal.
Depois de uma entrevista ao jornal ECO, a manager de recursos humanos da Gleba explica que a flexibilização dos prazos de pagamento “fazia sentido” para que os trabalhadores pudessem fazer face a situações emergenciais. Foi durante um ano de inflação alta que a Gleba decidiu flexibilizar os pagamentos aos seus trabalhadores.
Segundo referiu aquela manager, grande parte dos trabalhadores da Gleba usa esta possibilidade de antecipação do salário, apesar de não ser de utilização geral. É só mais uma possibilidade de aceder a dinheiro rapidamente. E que não deverá passar a ser prática comum. Atende, no fundo, a situações inesperadas. Por exemplo, quando a vida financeira dos trabalhadores enfrenta necessidades pontuais.
Exemplos de empresas portuguesas com pagamento flexível dos salários
A Procalçado é uma empresa portuguesa da indústria do vestuário, produzindo maioritariamente acessórios ou componentes para calçado. Esta empresa aliou-se à iniciativa do pagamento flexível de salários por solicitação dos trabalhadores. O pagamento antes da data acontece sempre que eles precisem. Claro que isso implica uma gestão de tesouraria eficaz. Mas havendo capacidade para isso, poderá haver liquidez para qualquer trabalhador em qualquer parte do mês.
Segundo diz Sofia Fonseca, responsável da Procalçado, ao jornal, a empresa tem 330 trabalhadores e todos eles estão abrangidos por esta possibilidade. Sejam eles trabalhadores a contrato ou não.
Podemos também olhar para o caso da sociedade de advogados CCA Law Firm, que já realizou 139 transações excecionais de antecipação do salário, ou seja, emite cerca de 11 pagamentos excecionais e antecipados por mês. Qualidade de vida, e redução do stress financeiro, são os motivos apresentados para avançar com esta medida.
Como funciona o adiamento de um salário?
Há vários fornecedores de serviços financeiros que já possibilitam a integração com a contabilidade de uma empresa para pagamentos flexíveis aos trabalhadores. Por exemplo, a Gleba usa o fornecedor Payflow. Também existe o fornecedor português Paynest, que é usado pela CCA Law, Procalçado e a Multipessoal. Ou o fornecedor Coverlex, entre outros.
No caso da Payflow, os trabalhadores têm acesso a uma área pessoal com o dinheiro acumulado em proporção dos dias trabalhados. Assim conseguem acompanhar em tempo real o dinheiro que vão gerando dia a dia, podendo solicitar um levantamento em qualquer altura. É só necessário indicar quanto querem levantar e o dinheiro é imediatamente transferido, sem ser preciso pedir autorizações especiais aos RH.
O que a Payflow permite é evitar contactos desnecessários em que os trabalhadores se sentem obrigados a justificar a necessidade de um pagamento fora de tempo, com a vergonha que por vezes está associada a isso. Com estes sistemas financeiros, tudo é automatizado e, desde que haja concordância da área financeira das empresas, os pagamentos devidos podem ser libertados em qualquer período do mês.
App Paynest permite gerir fundos – Um serviço financeiro personalizado
Para que os trabalhadores possam ter acesso completo ao sistema financeiro para o pagamento antecipado de salários, é necessário por vezes instalar a app desse sistema. É esse o caso da Paynest, que dá acesso a materiais educativos de literacia financeira, permite gerir fundos de modo mais inteligente, além de oferecer a opção de levantamento de fundos para a conta bancária.
Claro que as empresas, seja qual for o sistema de pagamentos instalado, têm sempre a última palavra sobre as regras a aplicar. Por exemplo, poderão só permitir um levantamento antecipado por mês, ou definir o período extraordinário de levantamento. A ideia é flexibilidade, mas há sempre a possibilidade de configurar parâmetros e definir regras, de modo a frisar confusões de contabilidade ou situações críticas de falta de liquidez em tesouraria.
Antecipação do salário já é praticada há muitos anos nos países anglo-saxónicos
Principalmente nos Estados Unidos, o pagamento do salário à semana, ou de duas em duas semanas, é uma possibilidade há largos anos e para um conjunto muito alargado de setores profissionais. Esta é vista como uma vantagem entre trabalhadores liberais precisamente pela liberdade que dá de gerir finanças de modo mais dinâmico ao longo do mês.
Claro que esta possibilidade não é também isenta de riscos. Por exemplo, poderá haver sistemas que cobram comissões por cada levantamento, pelo que com levantamentos frequentes o trabalhador perde remuneração no mês.
Por outro lado, levantar dinheiro em qualquer altura do mês pode criar uma falsa sensação de segurança. E se isso levar a gastos mais frequentes e a uma pior gestão do orçamento do mês, então os levantamentos antecipados podem-se revelar uma dor de cabeça.
É por isso que é de extrema importância promover iniciativas de literacia financeira, de modo a evitar situações comprometedoras para os trabalhadores. Saber gerir o orçamento do mês, definir custos fixos e variáveis, e ter objetivos de investimento de longo prazo são tudo necessidades importantes que os trabalhadores devem ter claras antes de beneficiarem destas ideias de liberalização do salário e dos pagamentos.