É um velho truque linguístico que todos conhecemos: a utilização de eufemismos permite suavizar a linguagem e as situações difíceis de aceitar. Esta é uma estratégia cada vez mais usadas pelas empresas. Muitas já adotaram para o seu arsenal de eufemismos termos como “layoffs”, “redimensionar”, “cortar gorduras”, “mudanças estratégicas”, entre outras expressões.
A forma como utilizamos a linguagem, falando em “desvinculação”, ou em “abraçar novos projetos”, é uma forma simpática de não dizer “despedimento”. Ajuda-nos a lidar com a situação de stress associada com esse processo. Também é útil aos empregadores que querem evitar debater compensações, direitos laborais ou gerir crises dentro da própria equipa. E, assim, mantê-la coesa.
A Bloomberg analisou a utilização cada vez mais evidente que as empresas fazem de eufemismos para a gestão dos seus recursos humanos. Vamos destacar essas estratégias e dar-lhe conta dos resultados obtidos.
Layoffs continuam em alta em 2024
Só no primeiro mês de 2024, a indústria das novas tecnologias já colocou em “lay off” 32.000 trabalhadores. O que parece estar a dar continuidade a uma tendência de despedimentos em massa que teve início com a pandemia. Trata-se de um movimento que atende a um mundo cada vez mais digitalizado, automatizado. E em que certas profissões tenderão a tornar-se obsoletas. Por isso, é cada vez mais importante saber comunicar más notícias aos nossos trabalhadores.
A comunicação é essencial para evitar má reputação, desmotivação na equipa, ou processos legais que possam ser ativados com investigações independentes. Por exemplo, pela Autoridade para as Condições do Trabalho ACT. E é por isso que os CEOs estão cada vez mais despertos para a necessidade de usar eufemismos (e linguagem positiva em geral) na comunicação com os trabalhadores.
Sandra Sucher, professora da Harvard Business School, diz claramente que a utilização de linguagem suavizada reflete a “alienação moral” das empresas. Especialmente as que pretendem racionalizar ou amaciar decisões que são difíceis, principalmente para os trabalhadores. Mas a estratégia é eficaz e por isso será cada vez mais utilizada para que ninguém fique mal na fotografia. E para que os negócios se possam reorientar e redimensionar sem grandes ondas de protesto ou desafios desnecessários na gestão dos recursos humanos.
Quando surgiram pela primeira vez as estratégias comunicacionais de gestão de equipas?
O léxico dos eufemismos tornou-se habitual nos anos 1980 e 1990, com a liberalização da economia e a aceleração da globalização. No caso português os despedimentos não podiam ser realizados sem danos ao trabalhador, já que as indemnizações e o pagamento da segurança social aos trabalhadores representavam sempre um custo elevado que impedia os tais “lay offs”. Mas claro que negociar despedimentos concertados a dois, e também com a liberalização imposta no mercado com a introdução dos recibos verdes (trabalho por conta de outrém) levou a processos mais ágeis e indolores no despedimento de pessoal.
Podemos olhar também para o exemplo de algumas empresas internacionais, como a Spotify, que optou pela expressão “redimensionar” quando lançou uma comunicação anunciando despedimentos de várias pessoas. O Citigroup, por seu lado, mencionou um “modelo operacional simplificado” para justificar 20.000 despedimentos. Já a Meta, de Mark Zuckerberg, falou em “mudanças organizacionais” para justificar a massa de despedimentos. E a United Parcel Service anunciou uma “redução na força de trabalho”, com 12.000 pessoas a irem para o desemprego.
A utilização de eufemismos nas empresas está a crescer
A Bloomberg dá conta de um incremento na utilização de eufemismos em substituição de outras expressões como “despedir”, uma vez que este termo tem uma carga negativa considerada demasiado pesada pela maioria dos gestores. “Layoffs” é o termo mais usado atualmente e que descreve o afastamento de um trabalhador, com uma conotação que expressa claramente as dificuldades de gestão da empresa.
Mas há outros sinónimos de “layoffs” a ganhar popularidade, cada um deles com uma função própria do ponto de vista da linguagem. Por exemplo:
- “Simplificar” – expressa os objetivos de otimização do negócio, reduzindo os trabalhadores considerados não-essenciais.
- “Reestruturar” – expressa, de um modo mais genérico, a necessidade de aplicar novos modelos de negócio nas empresas e que implica mexidas nos recursos humanos.
- “Redimensionar” – parecido a “reestruturar”, mas focando-se mais na componente estratégica do negócio de uma empresa.
- “Dispensar” – um termo próximo a “despedir”, mas que surge suavizado e com menos carga emocional associada.
O tipo de expressões que podem ser utilizadas varia de empresa para empresa, de acordo com o vínculo laboral do trabalhador, e também em função da cultura de trabalho vigente.
Por que “layoffs” é preferível a “despedimentos”?
A expressão “layoffs” surgiu durante a pandemia de Covid-19, para designar processos de despedimento globais, necessários e contingentes a externalidades como foi o caso da crise de saúde pública que fez parar algumas indústrias. Por isso, dizer que um trabalhador iria entrar em “layoff” era sinónimo de dizer que: a empresa está a enfrentar dificuldades e não tem alternativa a dispensar alguns trabalhadores.
Assim, um layoff é como um despedimento que tem origem nas dificuldades da empresa e não nas incapacidades do trabalhador, removendo o ônus da culpa, retirando carga emocional, e facilitando esse processo de afastamento de trabalhadores.
Um “despedimento”, além disso, é um processo que está tipificado e enquadrado nas leis laborais. Os trabalhadores que ouvem falar em “despedimentos”, sabem desde logo que esse processo está sujeito a critérios, e que há direitos a salvaguardar. Um “layoff” já soa a um processo extraordinário e que pode, inclusive, ser acordado entre as partes para minimizar prejuízos.
Métodos para despedir trabalhadores sem complicar a vida aos patrões
Como referimos, a utilização de eufemismos é essencial. Mas há outras estratégias que podem ser aplicadas, como:
- Comunicar antecipadamente a necessidade de fazer uma reestruturação à equipa, dando ao trabalhador a possibilidade de mudar de vínculo: passar de contrato a recibos, passar de full time a part time.
- Comunicar a todos os trabalhadores da empresa, antecipadamente, reorientação estratégica do negócio, preparando para uma nova forma de organização que implicará mudanças nos trabalhadores em funções.
Tudo passa pela comunicação, num processo que não é fácil para nenhuma das partes. Contudo, é importante estar à altura do momento e saber comunicar claramente quando é necessário emagrecer a massa de trabalhadores.
O que as principais empresas fazem para despedir
Estas são algumas dicas de comunicação que poderá seguir e que as empresas de todo o mundo seguem para facilitar o processo. Tome nota:
- Marque uma reunião: Logo que fique decidido o despedimento de um trabalhador, é importante reunir com ele de imediato para evitar a criação de expectativas e garantir o máximo de tempo em funções possível após a decisão. De igual modo é importante que o gestor comunique a decisão diretamente ao trabalhador e evite intermediários. Assim a conversa decorre ao “mais alto nível”.
- Não faça despedimentos surpresa: A demissão de um funcionário não deve ocorrer repentinamente. Antes disso, prepare a equipa com uma comunicação sobre as dificuldades do negócio e a necessidade de reestruturação, procure dinamizar ações de treino e análises de desempenho, e só depois de processos que enquadrem o momento do negócio e das equipas é que deve avançar.
- Seja claro e cordial: É importante passar pouca informação, de forma clara e eficaz. Fale do processo de reestruturação, anuncie a necessidade de ele ser dispensado com base nas novas prioridades do negócio, e mantenha a calma e a simpatia nesse diálogo. Deve ser firme na comunicação, evitar ambiguidades e não deixe que o lado emocional tome conta de si.
- Exclua o funcionário das várias redes e acessos internos: Isso inclui email, acesso à intranet e outras credenciais de acesso.