O anonimato tem sido uma das batalhas mais importantes que muitos utilizadores enfrentes nas redes sociais, procurando garantir um dos seus direitos fundamentais online. Contudo, uma nova investigação revela que podemos não estar tão protegidos nas redes sociais como pensamos.
A investigação foi conduzida no website Economics Job Market Rumors, também conhecido pelo acrónimo EJMR e pelo seu conteúdo tóxico. O EJMR é muito popular, contando com 2.5 milhões de visitas mensais só em 2022, de acordo com dados da SimilarWeb.
A investigação foi publicada por Florian Ederer, um professor de gestão na Boston Universy, Kyle Jensen, um diretor associado de Yale, e Paul Goldsmith-Pinkham, um professor de finanças na Yale School of Management.
Os investigadores foram-se em duas questões: o que dizem os economistas sobre as questões do anonimato, e até que ponto chega o discurso tóxico entre eles?
Looking forward to Florian’s presentation this Thursday about an important topic: toxic speech in economics.
There has been a lot of speculation about how we geolocated millions of EJMR posts.
The truth is rather mundane—it's just public data and some math. pic.twitter.com/oxwLL7as1f
— Paul Goldsmith-Pinkham (@paulgp) July 18, 2023
O que descobriram foi que quase todos os conteúdos no website eram criados por contas anónimas que recebiam usernames de quatro caracteres ao postarem no EJMR. Na sua investigação, a equipa recolheu 47.630 endereços de IP distintos de utilizadores, e destes 66,1% eram os responsáveis por quase 7 milhões de publicações que foram difundidas ao longo de 12 anos.
Em consequência, foi possível fazer a geolocalização de publicações por geografias, instituições e contribuidores.
Avaliando os conteúdos tóxicos no website, muitos acreditam que os indivíduos responsáveis pelas publicações não eram economistas de topo mas trolls online. Contudo, a investigação também demonstrou que muitos dos conteúdos tóxicos eram publicados por pessoas de instituições de topo como Harvard, Stanford, MIT, NYU e da Universidade de Chicago.
Investigação mostra que os economistas usavam palavras tóxicas online
A investigação demonstrou resultados problemáticos, incluindo a utilização sistemática de expressões racistas entre economistas. Um dos utilizadores referia-se mesmo aos americanos afro-descendentes como um “inimigo” do país.
Os investigadores fizeram ainda o levantamento de discurso racista contra comunidades asiáticas, descobrir endereços de IP que pertenciam a Yale, Stanford, Harvard e Chicago. O sexismo e a misoginia eram também muito prevalentes entre economistas.
Uma das publicações, a título de exemplo, dizia: “As coisas eram MUITO melhores quando as melhores se focavam em educar crianças e alimentar os maridos”. Outro referia que a empregabilidade das mulheres estaria ligada aos seus atributos físicos.
A investigação concluiu o seguinte: “A nossa análise revela que os utilizadores que publicavam no EJMR são predominantemente economistas, incluindo membros dos escalões elevados da academia, do governo e do setor privado”.
Numa apresentação online que decorreu na semana passada, Ederer fez saber que não se trata só “de algumas maçãs podres”, mas antes que “a escala do problema é grande. A toxicidade está em todo o lado”.
A toxicidade abunda nas redes sociais
A investigação demonstrou também que 13% das publicações de universidades eram tóxicas – o que não é um valor reduzido – especialmente se considerarmos o grau de educação destes utilizadores.
É de notar que a percentagem de doutorados entre americanos negros está ainda abaixo da média americana para toda a população, e que é mais provável este segmento seguir doutoramentos em matemática ou outras ciências sociais do que em economia.
De acordo com Goldsmith-Pinkham, “a ideia de que há espaços anónimos, onde as pessoas se comportam desta maneira, reflete os podres desta profissão [dos economistas]”.
Entretanto, os investigadores tentaram afastar medos e enfatizar que os indivíduos identificados nas publicações com conteúdos tóxicos não seriam divulgados a público. Ainda que isso possa ser um sinal de alívio para os economistas envolvidos, as questões do anonimato na internet e em fóruns como este parece não estar asseguradas.
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Será que somos mesmo anónimos nas redes sociais?
Os investigadores só usaram dados disponíveis publicamente, e foi com esses dados que foram capazes de rastrear as identidades de múltiplos utilizadores do EJMR. Isso demonstra que arranjar um nickname ou um pseudónimo não serve de muito quando se trata de estar anónimo nas redes.
Este tema também deu importância ao debate sobre o anonimato nas redes sociais. Ainda que alguns acreditem que o anonimato e a proteção de identidade são direitos – especialmente entre populações comprometidas política ou socialmente – outros acreditam que isso poderá aumentar o fenómeno do trolling, bullying e outros aspetos de toxicidade nas redes sociais.
É ainda de referir que os conteúdos de ódio em plataformas de redes sociais como o Twitter têm vindo a aumentar. Alguns relatórios sugerem que os conteúdos de ódio no Twitter aumentaram desde que Elon Musk (o homem forte da Tesla) adquiriu a plataforma em outubro de 2022.
Conteúdo de ódio na plataforma já é conhecido há anos
No que respeita à investigação da EJMR, os conteúdos de ódio na plataforma já são conhecidos há anos. Em 2017, Alice Wu, uma estudante de licenciatura da Universidade da Califórnia, Berkley, publicou um artigo demonstrando a dimensão dos conteúdos sexistas no site.
Anya Samek, professora de economia que esteve entre os alvos do discurso de ódio no EJJMR desde 2009, acredita que o site não é responsável diretamente pela propagação dos conteúdos problemáticos.
Após o artigo de investigação ter sido publicado, Samek disse:
“Gostaria de ver as universidades a tomarem medidas para garantir que o discurso de ódio online parava nos seus próprios escritórios.”
Entretanto continuamos na expectativa sobre o que poderá acontecer aos economistas identificados na investigação, e de que forma a prevalência do discurso de ódio entre eles poderá ser contido. Ou sequer se a EJMR deve tomar medidas decisivas para atacar este problema identificado.
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