Nos seus últimos resultados revelados, um número recorde de empresas do S&P 500 fez abordagens e menções acerca inteligência artificial (IA). Com isto apontando esta tecnologia revolucionária nas suas previsões de lucros. Ora, tal reflete a euforia sentida em relação à tecnologia. Na verdade, muitas empresas de todo o espectro estão a tentar informar os mercados sobre as suas iniciativas de IA e como planeiam aproveitar a tecnologia para aumentarem as receitas e/ou cortar custos. No entanto, qual o real impacto para o ambiente essa desejada implementação de IA nos diferentes ramos de atividade?
De facto, segundo ambientalistas, escondido por detrás da euforia da IA – que pelo menos uma parte do mercado acredita estar agora em níveis de bolha – está o impacto ambiental da tecnologia. Para que se tenha uma ideia, impulsionado pela IA, espera-se que o consumo de energia dos centros de dados exploda. Ou seja, aumentará a pegada de carbono da tecnologia. Ainda, como consequência, levará a uma maior procura de água, que está entre os recursos naturais mais preciosos a nível mundial. Logo, fará todo o sentido analisar os diferentes relatórios afetos a este problema e como as empresas estão a tentar resolvê-lo.
Como a IA está a alimentar a procura por eletricidade, em níveis históricos?
Desde logo, embora o mercado de centros de dados da Nvidia registe um crescimento estelar e as receitas do segmento tenham aumentado mais de 400% – para 22,6 mil milhões de dólares no trimestre mais recente. Assim, a procura de eletricidade destes centros de dados também disparou e espera -se que aumente ainda mais.
No seu recente relatório, a Rystad Energy estima que a procura de energia dos centros de dados dos EUA, que atualmente é de 130 terawatts-hora (TWh), mais do que duplicaria, para 300 TWh. Isto até 2030. Além disso, o relatório também apontou para o aumento da procura do setor dos transportes, em plena transição em curso para os veículos eléctricos (VE).
Quais são as recentes previsões para o impacto ambiental de IA?
Ora, de acordo com Surya Hendry, analista da Rystad Energy, “este crescimento é uma corrida contra o tempo para expandir a geração de energia sem sobrecarregar os sistemas elétricos ao ponto de os stressar”. Além disso, a Goldman Sachs tem uma previsão ainda expansiva e estima que a procura global de energia dos data centers aumente 160% até 2030.
Assim, estas conclusões, que estima que uma consulta ChatGPT necessite em média quase 10 vezes mais eletricidade do que para processar uma pesquisa no Google, prevê que até ao final desta década, os centros energéticos representem entre 3-4% da procura global de eletricidade! Atualmente, representam apenas entre 1-2% da procura global deste setor vital para a qualidade de vida dos cidadãos.
IA irá mudar? Procura de eletricidade americana tem-se mantido estável
Notavelmente, apesar do aumento da população e de uma base instalada cada vez maior de dispositivos que consomem muita energia, a procura de energia nos EUA tem-se mantido praticamente estável ao longo da última década. A anomalia deve-se em grande parte à maior eficiência dos dispositivos, bem como a inovações como as luzes LED, que consomem muito menos energia do que os seus antecessores. Tal fenómeno também verifica-se em vários países europeus.
No entanto, com o impacto esperado de IA, aumento potencial do consumo de energia exigiria investimentos maciços em todo o ecossistema – desde a produção de eletricidade até à transmissão e distribuição. Assim, a Goldman Sachs estima que os EUA necessitariam de 50 mil milhões de dólares apenas para satisfazerem a procura de produção de eletricidade. Enquanto a Europa necessitaria de mais de 1 bilião de dólares para preparar a sua rede para a IA.
Como é que as empresas já tentam reduzir estas emissões extras?
Tal como se percebeu, embora a procura de eletricidade dos centros de dados esteja prestes a disparar, existem várias medidas que as empresas podem (e estão a tomar) para reduzirem a sua pegada de carbono. A mais proeminente delas é o aumento da percentagem de energias renováveis no seu cabaz eléctrico.
Por exemplo, no seu relatório ESG no início deste ano, a IBM afirmou que 74% da eletricidade consumida pelos seus centros de dados provinha de energias renováveis. Ou seja, oito pontos percentuais, sendo superior ao que era em 2022. No entanto, as incursões da IA significaram que a pegada de carbono das grandes empresas tecnológicas se expandiria. Por exemplo, as emissões de carbono da Microsoft aumentaram 30% desde 2020 e a empresa poderá falhar o seu objetivo de se tornar negativa em carbono até ao final desta década.
Microsoft admite falhas na sua pegada de carbono, após impacto de IA
De facto, recentemente, esta mega empresa confirmou que exigiria que alguns fornecedores utilizassem eletricidade 100% livre de carbono. Isto até ao final desta década, para ajudarem a cumprir os seus objetivos climáticos. Em entrevista ao Wall Street Journal, a Diretora de Sustentabilidade da Microsoft, Melanie Nakagawa, levantou uma questão importante:
“Embora os avanços possam necessitar de mais consumo de energia, isto está necessariamente relacionado com um aumento das emissões. Ou é possível fazê-lo de uma forma livre de carbono?”
Microsoft considera polémica energia nuclear para reduzir as emissões
Ora, para reduzir as emissões, a Microsoft está mesmo aberta à ideia de pequenos reatores nucleares. Notavelmente, juntamente com o fornecimento de eletricidade, a partir de fontes renováveis, as empresas também podem investir na geração de eletricidade no local, especialmente solar e eólica. Dado que a IA conduz invariavelmente a um aumento da procura de eletricidade, as empresas poderão necessitar de tomarem medidas adicionais para cumprirem os seus próprios objetivos de sustentabilidade.
Reatores nucleares internos serão solução para este aumento de consumo?
Por exemplo, uma pesquisa da Universidade de Buffalo referiu que “os gestores de centros de dados podem reduzir o consumo de energia de 10 a 30%. Isto consolidando os trabalhos no menor número possível de servidores quando as cargas de trabalho são elevadas. Isto ao mesmo tempo que distribuiriam uniformemente a carga de trabalho por todos os servidores, quando as cargas são baixas.
Entretanto, embora a solução alternativa para as emissões de carbono pareça um tanto simples. Ou seja, as empresas precisariam de pensar fora da caixa quando se trata de água. Assim, vários países em todo o mundo estão a lutar contra a grave escassez de água e a IA está a alimentar ainda mais a procura de água, o que só poderá amplificar a crise.
Como é que a IA está a alimentar a procura por água?
Embora a procura de eletricidade da IA receba bastante atenção, o uso de água não tem tanta cobertura. Contudo, a água é utilizada em todo o ecossistema de IA, incluindo no arrefecimento de “data centers” e durante a produção de eletricidade. Notavelmente, diferentes metais raros requerem muita água durante o processo de produção. Além disso, o cobre, cuja procura deverá aumentar durante o pivot da IA, tem um processo de produção que utiliza muita água. Além disso, a investigação demonstrou que o ChatGPT consome 500 mililitros de água por cada cinco a 50 pedidos. Enquanto uma única pesquisa no Google requer meio mililitro de água em energia!
De acordo com a Universidade de Cornell, “a procura global de IA poderá ser responsável por 4,2 – 6,6 mil milhões de metros cúbicos de captação de água em 2027. O que é mais do que a captação anual total de água de 4 – 6 países da Dinamarca ou metade do Reino Unido”. Como tal, já existem preocupações sobre o uso de água pela IA e o “data center” da Google em The Dalles, Oregon, enfrentou escrutínio por estar numa região com escassez de água. Será este um presságio do que muitas empresas tecnológicas terão que passar para resolverem as suas metas ambientais até ao final da presente década?
Como podem as empresas de IA reduzir a sua pegada hídrica?
Segundo especialistas, as empresas de IA poderão ter de procurar formas inovadoras de reduzirem o consumo de água. Por exemplo, no seu relatório de sustentabilidade de 2024, a Microsoft afirmou que está a trabalhar na “redução do uso de água e na reposição de mais água do que aquela que consumimos nas nossas operações de data center”.
O relatório acrescentou que a Microsoft está a trabalhar num projeto de reabastecimento de água “que aproveita a análise acústica habilitada por IA para reduzir a perda de água por fuga”. Por exemplo, Taiwan, que representa a maior parte da produção de chips avançados e alberga a TSMC, que fabrica chips para a Nvidia, utilizou técnicas como a semeadura de nuvens e a dessalinização de água para reabastecer a água.
Dito isto, embora, em muitos aspetos, a IA ajudasse a resolver a escassez de água e as alterações climáticas. Isto através de uma melhor utilização da tecnologia, as empresas de IA terão que encontrar diferentes soluções face às exigências ambientais de IA. Isto numa tentativa de irem de encontro com as suas cruciais metas da sustentabilidade, que se estão agora a tornar cada vez mais um desafio de elevadas proporções.