Europa carros elétricos

Numa altura em que muito se discute a entrada em força de fabricantes chineses na Europa de Veículos Elétricos, é altura de repensar a relação de forças entre os principais blocos económicos mundiais. Se os EUA têm vindo a encetar autênticas guerras económicas com a China, aplicando taxas alfandegárias de praticamente 100%, a Europa parece refém da China e o seu mercado tenderá a abrir-se.

O facto é que a dependência do bloco europeu das grandes empresas chinesas é hoje uma evidência, com a EDP sendo detida pela Three Gorges chinesa em Portugal. Mas com muitos outros casos idênticos espalhados pelo continente. Nos últimos anos a China tem vindo a posicionar-se de forma estratégica na Europa, e por isso este é o momento de conquistar o mercado Europeu com bloqueios mais reduzidos e milhões de euros que poderá conquistar.

A eficácia norte-americana e a fraqueza da Europa face à entrada das empresas chinesas nos mercados a ocidente

Depois de anos a comprar empresas estratégicas por todo o território europeu, a desenvolver laços diplomáticos entre os Estados e a recolher know how de tecnologias de ponta, a China prepara-se para um passo de gigante. Se os Estados Unidos ainda conseguem contrariar essas intenções com as tarifas de importação proibitivas, a Europa terá de escancarar portas.

O primeiro embate poderá dar-se já a partir de 2025, com uma série de fabricantes chineses de veículos elétricos a quererem apostar em força no mercado Europeu. Sabemos por exemplo que a Polónia tem empresas nacionais capitalizadas por fundos chineses e que ajudarão a produzir carros elétricos polacos mas com acionistas chineses. Mas haverá fabricas chinesas na Hungria, e possivelmente na Espanha ou França.

A China começou também a apresentar os seus modelos europeus da Nio, Xpeng e BYD nos últimos salões automóveis de Paris e Amesterdão. A União Europeia é, por isso, um mercado apetecível apesar de toda a resistência dos últimos anos em abrir o seu mercado. A competição com os fabricantes europeus será feroz, mas os consumidores sairão beneficiados, já que modelos como o Seagull da BYUD poderão ser vendidos com descontos importantes face a modelos europeus idênticos.

Os passos protecionistas dos EUA para travar a hegemonia industrial da China

Foi a 14 de maio que a Administração Biden lançou nova bomba atómica sobre as relações comerciais com a China. Nessa data, e contrariamente ao que muitos analistas previam, o presidente americano decidiu aumentar as taxas alfandegárias de 25% para 100%. Uma medida radical que quer demover qualquer intenção de a China instalar fábricas simultaneamente na Europa e nos EUA.

Esta é uma política protecionista radical, que revela o medo da conquista mais que previsível que a China pretende levar a cabo dos mercados internacionais e particularmente a ocidente. Sendo que a indústria dos veículos elétricos é uma das mais apetecíveis. É que unir os fatores de mão de obra barata, com grande inovação tecnológica e os apoios públicos, permite à China oferecer veículos mais baratos que a Tesla ou com qualidade idêntica aos modelos mais avançados. Só para dar um exemplo.

Preços dos carros elétricos chineses são tão baratos que poderão arruinar o mercado Europeu

Se é quase certo que a marca automóvel BYD irá mesmo instalar-se na Europa, por outro lado não sabemos a dimensão do estrago que isso terá para a concorrência. Vejamos alguns exemplos…

O veículo mais barato da BYD é hoje vendido em torno dos 10.000 euros. Este é valor muito abaixo dos modelos de entrada dos principais fabricantes europeus ou norte-americanos. Um valor que é, também, muito apetecível para uma classe média que está a perder poder de compra mas que não quer abdicar do novo paradigma da mobilidade verde com veículos pessoais urbanos.

Como a União Europeia tem tentado travar a China

Só em outubro do ano passado, depois de muitos anos de entrada de capitais chineses em setores estratégicos e empresariais europeus, é que a Comissão Europeia começou a contrariar os avanços da China. Foi nessa altura que começou a investigar a possibilidade de distorções comerciais na atribuição de subsídios à atividade comercial.

Ainda não foram reveladas as conclusões daquela investigação. Mas, se se confirmar que o Estado chinês está diretamente empenhado em constituir posições hegemónicas do ponto de vista comercial, a UE poderá ter base para aplicar tarifas mais elevadas.

Apesar disso, não se espere que a União Europeia desembainhe uma solução radical como a dos EUA que aplicam tarifas de 100% à China. A UE parece comprometida com os princípios da Organização Mundial do Comércio, o que implica a aplicação de tarifas em proporção da distorção comercial apurada. Além disso, e fruto da grande dependência Europeia dos setores financeiros e empresariais chineses, os bloqueios levantados poderão ser mais leves.

Quais os fatores que impedem a UE de seguir uma política protecionista?

O think thank Bruegel publicou recentemente as suas conclusões sobre os fatores condicionantes da aplicação de tarifas à China por parte da União Europeia. Um desses fatores seria o facto de os produtos automóveis europeus estarem dependentes da China, ainda mais do que dos EUA. Isso é válido para tudo, desde as exportações, ao fabrico com recurso a mão de obra chinesa, e fornecimento de materiais fundamentais à construção. Por isso, a capacidade retaliatória da China seria muito elevada.

Por outro lado, não é possível obter o consenso dos vários Estados-membro relativamente à aplicação de tarifas. A Hungria, como referimos, vai instalar uma fabrica chinesa da BYD muito em breve no seu território. E mesmo Portugal dificilmente se poderia opor ao comércio com a China, já que tem setores como o energético diretamente dependentes de acionistas chineses.

A conquista chinesa da Europa já começou com os painéis solares

Estamos apenas no início do que poderá ser a verdadeira avalanche de produtos inovadores chineses, a preços muito competitivos, do espaço Europeu. Os painéis solares chineses, por exemplo, já representam 97% de toda a oferta na Europa.

Se virmos que a Europa está comprometida com metas muito exigentes de transição energética e de descarbonização, então ainda mais difícil fica de justificar bloqueis a produtos “verdes”. É também por isso que os painéis solares na Europa são, hoje, maioritariamente chineses.

Segundo as metas europeias, até 2030 pretende-se que as fontes de energia renováveis representem entre 42,5% a 45% da energia consumida. A energia elétrica foi das primeiras apostas, com o preço dos produtos solares a baixar de forma exponencial à medida que o mercado também se ia desenvolvendo. Licenciamentos facilitados, custo de exploração e fabrico mais baratos, levaram a que a China se tornasse na principal fornecedora.

Guerra comercial ou regulação? Como a Europa poderá reagir às investidas chinesas?

A guerra comercial, à escala do que os EUA estão a fazer com a China, não é hoje opção para a Europa. Em vez disso, a aposta numa diplomacia económica, capaz de estabelecer parcerias estratégicas com vista ao cumprimento das metas de descarbonização, parecem ser a solução.

Isso significa passar a dialogar com o Estado chinês e o seu tecido empresarial olhos nos olhos, impondo regulação do ponto de vista das normas europeias em vigor, mas sem antagonizar as importações.

Um dos maiores desafios vai ser resistir aos padrões de trabalho e fabrico chinês, que são competitivos exatamente devido à mão de obra barata. Mesmo que a União Europeia decida atribuir fundos públicos aos fabricantes para dinamizar a sua indústria, o pagamento de salários baixos é algo que ninguém aceitará. E, para evitar esse dumping social, a União Europeia poderá forçar medidas de fiscalização e regulação, que poderão aumentar os custos dos veículos elétricos ao consumidor final.

2025 será certamente o ano mais surpreendente do ponto de vista das relações comerciais entre Europa e China. E um ano de grande expectativa para os consumidores europeus que poderão começar a aceder a produtos com tecnologia verde de ponta (como no caso dos veículos elétricos) a preços muito reduzidos face aos atuais que são praticados.

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