Antes de explicar a aproximação do Congressista americano George Santos e alguns nomes de peso do setor cripto, é importante explicar a situação do político.

Santos surgiu como um assombro eleitoral: filho de brasileiros, gay e de ascendência judaica, partiu de origens humildes para se tornar um milionário e ser eleito para a Casa dos Representantes (equivalente à Câmara dos Deputados no Brasil) por um distrito da liberal cidade de Nova Iorque na legenda do conservador Partido Republicano, batendo um veterano de três mandatos no Congresso.

Várias mentiras de Santos são descobertas

Depois de eleito, porém, o assombro revelou-se um espanto à medida que a imprensa desencavava discrepâncias entre o passado de George Santos como descrito por este e a realidade.

O site da revista New York catalogou as mentiras contadas por Santos e se trata de um conjunto impressionante. Por exemplo, ele mentiu sobre onde cursou o Ensino Médio, sobre ter se formado em economia e ter um MBA, mas também sobre ter trabalhado em Wall Street em firmas como CitiGroup e Goldman Sachs.

O patrimônio de Santos, tanto no que se refere à sua extensão como à sua origem, levanta questões. Em sua campanha fracassada ao Congresso em 2020, Santos preencheu uma declaração financeira em que não listava bens. Seu salário era de 55 mil reais anuais.

Dois anos depois, na disputa de 2022, que ele acabaria por vencer, declarou uma empresa que valia cerca de US$ 5 milhões de dólares e um salário pago por ela de US$ 750 mil dólares por ano, além de outros bens, emprestando milhares de dólares à própria campanha.

No entanto, uma matéria do The New York Times mostrou que a empresa do político, chamada de Devolver, sobrenome de solteira da mãe dele, não tinha página na Internet ou perfil na rede social profissional LinkedIn. Além disso, a declaração do então candidato não listava clientes.

Embora Santos afirme estar casado com um homem, não se achou registro do matrimônio. Ele omitiu ter mantido um casamento de sete anos com uma mulher. Emergiram evidências de que ele cometeu crimes no Brasil, por um dos quais chegou a ser processado – o roubo do cartão de cheques de um paciente que sua mãe, uma enfermeira, tratava, quando tinha 19 anos.

A imprensa não achou evidências da ascendência judaica de Santos, muito menos de uma avó que, segundo ele, foi morta no Holocausto. Aparentemente também é uma mentira do republicano que sua mãe estivesse em uma das torres do World Trade Center no 11 de setembro, ao qual sobreviveu.

Cada vez ficava mais claro que o George Santos apresentado aos eleitores pela campanha vitoriosa de 2022 era uma personagem de ficção. Em artigo para a Folha de São Paulo, a jornalista Lúcia Guimarães comparou Santos ao personagem-título de O Talentoso Mr. Ripley, filme estrelado por Matt Damon, cujo personagem, dotado de grande talento para imitar as pessoas, assassina o filho de um empresário que deveria ter buscado na Europa e assume seu lugar e seu estilo de vida.

Santos se junta ao setor cripto

Apresentada a personagem e parte do que se sabe sobre suas contradições, vejamos onde a saga do político se encontrou com a do setor de criptomoedas. No verão de 2022, ano em que seria eleito para o Congresso, Santos esteve em Southampton, um vilarejo da ilha de Long Island, na costa do Estado de Nova Iorque, frequentado pela elite financeira novaiorquina.

Entre os muito ricos presentes, encontravam-se alguns jovens executivos que negociavam criptomoedas, com os quais o então candidato descobriu uma convergência de interesses.

Compreensivelmente, as empresas desejam que os regulamentos escritos para seu setor lhes sejam favoráveis, e os executivos da indústria cripto estão dispostos a pagar por isso.

A indústria cripto doou cerca de US$ 80 milhões nos anos de 2021 e 2022 para campanhas políticas e para os comitês federais de partidos, mais do que perenes contribuintes como o setor de defesa e laboratórios farmacêuticos.

Naquele verão, Santos participou de eventos de arrecadação de fundos para políticos republicanos, entre os quais Michelle Bond, que acabaria perdendo a disputa pela indicação do partido a uma cadeira no Congresso.

Embora Sam Bankman-Fried, conhecido como SBF, CEO da corretora FTX, cuja falência no fim do ano passado surpreenderia o mercado, costumasse doar aos democratas, muitos executivos da empresa contribuíram com a campanha de Santos, entre eles, Ryan Salame, namorado de Bond.

Ele, assim como seus pais, fez uma doação no valor máximo permitido a uma pessoa física, pouco mais de US$ 5000 dólares. Outros pesos pesados do setor de criptoativos também ajudaram com dinheiro.

É verdade que, segundo artigo do Valor Econômico, os executivos de empresas de criptomoedas forneceram apenas uma pequena parcela dos fundos da campanha de Santos, que obteve mais dinheiro de fontes como executivos de seguros e incorporadoras imobiliárias.

Mas é difícil não enxergar uma similaridade entre George Santos e os executivos do setor de criptomoedas, especialmente figuras famosas como SBF, que aguarda nas Bahamas, país onde vive, julgamento do pedido da Justiça americana para ser extraditado para os Estados Unidos, onde deverá ser julgado por acusações como fraude e transgressões às leis que regulamentam as doações de campanha.

Tanto o político republicano quanto os titãs do setor cripto pareciam histórias de sucesso e realização, mas, ao final de 2022, passaram a ser submetidos a um olhar mais crítico. No caso de Santos, que pode perder o mandato, a mudança se deveu à infindável torrente de revelações sobre seu passado e suas mentiras.

A confiança do público nas criptomoedas e nas empresas que lidam com elas foi abalada por colapsos como os da stablecoin TerraUSD, da plataforma de empréstimos Voyager e o da corretora FTX, que talvez tenha sido a gota que fez transbordar a taça.

O ano de 2023 dirá se o político acuado pelo passado e a indústria acuada pelos erros de alguns de seus atores conseguirão recuperar a confiança do público e recuperar-se, ou se tudo que sobrará é a história do que poderia ter sido, mas não era.

Investimentos em renda variável envolvem operações de alto risco e podem não ser indicados para novatos.

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