Embora, na percepção pública, esteja intimamente associada a ativos como criptomoedas e NFTs negociados como investimentos e com a realização de pagamentos, a tecnologia do blockchain tem outras aplicações, cuja natureza não é diretamente financeira.

Características dessa tecnologia, como agilidade, segurança, imutabilidade e transparência, permitem que ela se preste a vários usos, em diferentes atividades e setores, atendendo às necessidades de variados atores.

O blockchain pode, por exemplo, ser usado no licenciamento e na distribuição de conteúdo artístico, motivo do acordo entre Metro Goldwyn Mayer (MGM) e a plataforma Eluvio Content Fabric para streaming de propriedades intelectuais, ou no gerenciamento de arquivos, como os de empresas ou os do setor público.

Outros exemplos de usos que podem ser dados à tecnologia de blockchain estão na administração de arquivos e documentos, sejam eles públicos ou privados, no controle de cadeias produtivas e na identificação e no rastreamento de objetos e itens.

Iniciativa de usar blockchain para rastrear gado é do Estado do Ceará

O Diário Oficial da União publicou, no dia 3 de março, o extrato de um acordo, assinado no dia anterior pela empresa Constanta Industrial LTDA, pela Fundação Cearense de Pesquisa e Cultura (FCPC) e pelo Instituto Federal de Educação, Ciência e Tecnologia do Ceará (IFCE). Trata-se de uma cooperação técnica para o estudo e desenvolvimento de alternativas de aplicação de IOT ao registro e rastreamento do gado com uso de blockchain.

A empresa atua provendo de soluções em eletrônica setores como o automotivo, o de energia, o de telecomunicações e o de Internet das Coisas (ou IoT, da sigla do nome em inglês, Internet of Things). A Internet of Things (IoT) ou Internet das Coisas é um conceito que se refere a uma rede que conecta objetos e dispositivos dotados de tecnologias como sensores e software que permitem que troquem informações.

Objetos que podem estar ligados à Internet das Coisas incluem, para citar alguns exemplos, eletrodomésticos como geladeiras inteligentes, ferramentas industriais, câmeras de segurança e equipamentos agrícolas. Estima-se que os dispositivos ligados à Internet das Coisas já passem de 7 bilhões e venham a ser mais de 22 bilhões até 2025.

A parceria firmada entre Constanta Industrial, FCPC e IFCE é para um projeto de PD&I (ou seja, Pesquisa, Desenvolvimento & Inovação, em que se aliam pesquisas, científica e aplicada, e a busca de inovação tecnológica) e deverá durar por 15 meses a contar da publicação do acordo.

As partes signatárias deste acordo de cooperação técnica deverão seguir o Plano de Trabalho do projeto. Deste documento, constam (quando cabível) dados como orçamento, premissas, metas, cronogramas de tarefas dos participantes, riscos, etc. Foi destinado a essa parceria o valor global de R$ 791.708,23 reais.

A Constanta Industrial e a FCPC contribuirão com seu know-how enquanto o IFCE proverá o projeto de coordenação técnica das atividades.

Conheça as organizações envolvidas no projeto

A Constanta Industrial é uma empresa que foi fundada no início da década de 50, quando produzia, entre outros itens, resistores de carvão. Durante quase três décadas, a partir de sua aquisição em 1969, foi parte do Grupo Philips, do qual foi comprado por empresários paulistas na segunda metade da década de 90.

A Fundação Cearense de Pesquisa e Cultura (FCPC) é uma fundação de apoio à Universidade Federal do Ceará (UFC). Embora seja uma instituição de direito privado, não possui fins lucrativos.

A FCPC foi criada em 1977, e seu status de fundação de apoio à UFC baseia-se na Lei 8.958/94, que permitiu o credenciamento de organizações como ela junto a Ministérios como o da Educação e o de Ciência e Tecnologia, com permissão de representantes dos quais pode, também, apoiar outras instituições de Ensino Superior.

O Instituto Federal de Educação, Ciência e Tecnologia do Ceará (IFCE) tem sede em Fortaleza e unidades em diversos outros municípios do estado do Ceará. Foi criado com a integração do Centro Federal de Educação Tecnológica do Ceará com Escolas Agrotécnicas Federais existentes em território cearense. É uma autarquia ligada ao Ministério da Educação e, para diversos efeitos, é legalmente equiparada às universidades federais.

Já há alguns exemplos do uso de tecnologia de rastreamento na pecuária

Há alguns outros projetos interessantes de uso de blockchain e IoT para ajudar os fazendeiros no monitoramento e rastreamento de seus animais de modo a preservar a lucratividade de seus empreendimentos, a segurança dos consumidores e até a sustentabilidade da atividade pecuária.

O produtor de bovinos que for fornecedor da JBS pode inscrever-se gratuitamente na Plataforma Pecuária Transparente, que faz um cadastro dos participantes e usa a tecnologia de blockchain, o que impede que os dados sejam adulterados ou acessados por pessoas não autorizadas, além de permitir que a empresa monitore os elos da cadeia produtiva.

Os dados obtidos permitem um maior controle do nível de conformidade socioambiental dos participantes, aumentando as chances de que a empresa possa identificar práticas que causem danos ao Meio Ambiente e consiga fazer com que cessem.

Outro exemplo é o projeto IBM Food Trust, que como o nome indica, foi criado pela IBM, firma do setor de computação. Ele usa redes de blockchain para registrar a história de um animal, como sua alimentação e seu histórico de vacinação, e certificar a proveniência dele.

Colocando a empresa, ao colocar sua experiência em tecnologia a serviço dos rancheiros, permite que os fazendeiros dissociem sua experiência de usuários, que é simplificada, das complexidades dos recursos envolvidos, permitindo que certifiquem os métodos que usam para criar seus animais.

A solução IBM Food Trust foi oferecida aos rancheiros do estado americano de Wyoming, que enfrentam decrescentes margens de lucro, para que possam certificar seu produto, produzido, segundo a explicação da IBM, com práticas tradicionais e éticas, como de qualidade superior e digno de preços mais elevados no mercado em comparação com a carne oriunda de uma pecuária mais industrial.

O consumidor, que pode ter certeza quanto às origens e o histórico da carne que comerá, também ganha com a adoção dessa tecnologia.

Blockchain para rastrear outro também é uma solução em discussão

A tecnologia de blockchain também já foi proposta como uma forma de controlar o ouro minerado no Brasil, permitindo que seja rastreado e dificultando a entrada do metal extraído ilegalmente, por exemplo, em terras onde o garimpo é vedado, no mercado.

Ainda em 2022, antes de terem vindo à tona os recentes casos de desnutrição e até morte de Yanomamis e de se ter renovado e intensificado a indignação pública com a intrusão do garimpo em áreas de reserva indígena, Joênia Wapichana, deputada federal filiada à Rede e pertencente à bancada do Estado de Roraima, apresentou um Projeto de Lei para a introdução de um sistema que incorpore a tecnologia de blockchain para o rastreamento do ouro produzido no Brasil.

Boa parte do território de Roraima é abrangido por reservas indígenas, onde os choques entre os índios e o garimpo ilegal constituem um grave problema de segurança e a invasão de território dos indígenas por garimpeiros ameaça a existência e o modo de vida dos primeiros.

Um exemplo de aplicação de blockchain ao rastreamento do ouro é a plataforma STAMP, criada e fornecida pela empresa canadense Blockhead Technologies Inc. Seu objetivo principal é atender o interesse das companhias em monitorar e controlar o mineral através das diversas etapas das cadeias produtivas de que participa, de modo que possam estar certos de sua origem, saber sua localização e provar sua posse.

Isso, porém, também pode ajudar consumidores e empreendimentos inocentes das cadeias produtivas do ouro a evitarem o metal de origem ilegal e contribuir com os esforços dos governos para a repressão do garimpo clandestino e para o combate à comercialização do produto de suas atividades criminosas.

Investimentos em renda variável envolvem operações de alto risco e podem não ser indicados para novatos.