Gol? Empresa aérea entra em recuperação judicial

A Gol Linhas Aéreas encontra-se em um processo de recuperação judicial nos Estados Unidos. Esta é uma decisão estratégica que poderá acelerar a conclusão do procedimento em comparação com o sistema judiciário brasileiro.

Este processo, contudo, não indica uma situação de falência para a empresa. Segundo representantes da Gol, o objetivo dessa medida é reestruturar suas obrigações financeiras de curto prazo e reforçar a estrutura de capital da companhia, buscando sustentabilidade a longo prazo.

Ary Bertolino, consultor sênior da ARB Consultoria, esclarece que, ao contrário do que muitos podem pensar, a recuperação judicial não é um prenúncio de falência, mas sim um meio para as empresas traçarem caminhos de recuperação e desenvolvimento.

Adota-se essa abordagem jurídica com certa frequência para evitar a falência, permitindo que a empresa em questão tenha um período de suspensão das cobranças e possa reavaliar suas dívidas.

Durante este período, a Gol terá a oportunidade de negociar com seus credores maneiras de lidar com suas dívidas. A Justiça declara falência apenas se, ao final do processo, não houver um acordo de negociação efetivado.

Entenda a dívida bilionária da Gol

Até setembro de 2023, a Gol Linhas Aéreas enfrentava um desafio financeiro com uma dívida próxima de R$ 20 bilhões. Surpreendentemente, deve-se a maior parte desse valor a arrendadores de aeronaves. A empresa, contudo, garantiu a manutenção de sua frota de aeronaves, descartando a possibilidade de redução.

A situação econômica adversa da Gol tem suas raízes na pandemia, nos altos juros e na valorização do dólar. Esses fatores contribuíram para que a dívida da companhia aérea alcançasse R$ 18,5 bilhões em 30 de setembro de 2023, marcando um aumento de 15,9% em relação ao mesmo período de 2022.

Além disso, a análise financeira da Gol revela que seriam necessários quase seis meses para a empresa liquidar sua dívida, considerando a totalidade de seus ganhos para este fim.

Em setembro do ano passado, o indicador de alavancagem financeira da Gol, que compara a dívida líquida ajustada com o EBITDA (lucro antes de juros, impostos, depreciação e amortização) dos últimos 12 meses, registrou um índice de 5,5 vezes.

Como parte de uma estratégia para reestruturar suas finanças, a Gol contratou em dezembro a Seabury Capital, uma consultoria especializada no setor de aviação.

Como segue a recuperação judicial da Gol nos EUA

A Gol Linhas Aéreas obteve autorização para um financiamento de US$ 950 milhões, seguindo a modalidade “devedor de posse”. A aprovação, que ainda terá sua oficialização em uma audiência nas próximas semanas, ocorreu no Tribunal de Falências do Distrito Sul de Nova York.

Recentemente, a Gol acionou o Chapter 11 nos Estados Unidos, um mecanismo judicial destinado à reestruturação de empresas. Essa estratégia é conhecida por permitir que as companhias reforcem suas posições financeiras enquanto mantêm suas operações regulares, sob a supervisão e aprovação do sistema judicial norte-americano.

A decisão de recorrer ao Chapter 11 foi influenciada pela localização dos credores da Gol. Estes estão majoritariamente nos Estados Unidos, com destaque para o setor de aeronaves. Celso Ferrer, CEO da empresa, destacou que o Chapter 11 assegura o pagamento aos fornecedores essenciais, uma medida vital para a continuidade das operações da companhia tanto localmente quanto internacionalmente.

O recurso do Chapter 11 não é novidade no setor aéreo, tendo sido utilizado anteriormente por companhias como Latam, United Airlines, Delta, Aeroméxico e Avianca Colômbia. A escolha por essa via de reestruturação de dívida nos Estados Unidos, conforme explicado por Ferrer, visa garantir a estabilidade operacional e financeira da Gol em um cenário desafiador.

Além do Chapter 11, por que exatamente nos EUA?

Em suma, considera-se o mecanismo do Chapter 11 mais favorável ao mercado e mais maduro do que a legislação brasileira de recuperação judicial.

Segundo Bertolino, da ARB Consultoria, a recuperação judicial nos EUA pode ser surpreendentemente benéfica para as empresas, permitindo-lhes renegociar dívidas sob supervisão judicial e proteger seu caixa de despesas com vencimentos antecipados.

Entretanto, esse benefício traz implicações para os acionistas minoritários. Análises de diversos bancos de investimento indicam que esses acionistas podem enfrentar uma diluição significativa em suas participações, possivelmente ultrapassando 60% no cenário-base.

Este cenário de incerteza resultou em um impacto negativo no mercado de ações, com as ações da companhia em questão registrando uma queda expressiva de 33,6% nesta segunda-feira (29/01) na B3, cotadas a R$ 3,93.

Aparentemente, a Gol realizou pedido de proteção antes do previsto

A Gol antecipou seu pedido de proteção contra falência nos Estados Unidos após o vazamento de informações sobre sua insolvência. Um advogado da companhia aérea declarou esta informação durante uma audiência por vídeo na última sexta-feira.

A medida buscava prevenir ações dos credores que pudessem afetar seus ativos, levando a administração a solicitar proteção judicial em Nova York.

Em um contexto onde grandes companhias aéreas latino-americanas, como Avianca, Latam Airlines e Grupo Aeromexico, recorreram ao pedido de recuperação judicial (RJ) em 2020, enfrentando processos longos, a Gol se junta à lista em um período desafiador para o setor.

Nos anos subsequentes, empresas menores, incluindo a mexicana Interjet e a colombiana Viva Air, encerraram suas atividades.

Empresas aéreas na América Latina sofrem mais devido aos custos em dólar

A analista de crédito da Moody’s, Carolina Chimenti, destacou a vulnerabilidade da indústria aérea na América Latina, exacerbada no Brasil.

Em resumo, isto se dá pela dependência de custos em dólar, inflação e taxas de juros elevadas, que impactam a renda disponível e a demanda por voos. Por isso, Carolina Chimenti aconselha que as companhias aéreas da região adotem uma postura mais conservadora em relação ao seu capital.

Embora a demanda por voos na América Latina tenha se recuperado aos níveis pré-pandemia, a Gol ainda enfrenta dificuldades financeiras. Este cenário é diferente do de companhias aéreas norte-americanas e europeias que receberam resgates governamentais.

Recentemente, o governo brasileiro passou a considerar empréstimos como parte de uma estratégia para mitigar a pressão financeira sobre as companhias aéreas locais.

Ações da Gol sairão do Ibovespa e de mais outros índices relevantes

Primeiramente, as ADRs (American Depositary Receipts) da companhia aérea foram suspensas nos Estados Unidos, enquanto suas ações serão removidas de todos os índices da B3. Apesar disso, as ações da Gol continuam sendo negociadas normalmente, mas sob a classificação de “outras condições” a partir de hoje (30/01) na B3.

A Guide Investimentos revelou que o mercado já antecipava a saída da Gol de todos os índices da B3, seguindo o pedido de recuperação judicial nos Estados Unidos. Com isso, os fundos de índice que detêm essas ações seriam forçados a vendê-las, provocando uma queda no preço dos papéis.

Adicionalmente, a Guide Investimentos apontou que a reação negativa do mercado iniciou-se com rumores da entrada da companhia no Chapter 11, e se intensificou com a confirmação do fato. A suspensão das ADRs, no entanto, não era completamente antecipada pelo mercado, uma vez que nem sempre as empresas que fazem esse tipo de pedido têm suas ações suspensas.

Por fim, a Gol terá seus papéis excluídos dos índices IBOV, IBRA, IBXX, ICO2, IDVR, IGCT, IGCX, ITAG, IVBX e SMLL.

Ações da Gol fazem sua despedida do Ibovespa com forte queda

Hoje (30/01), as ações da Gol despencaram e foram o destaque negativo do Ibovespa pelo terceiro dia seguido. Sobretudo, a queda expressiva de 26,97% levou os papéis da companhia aérea a fecharem a R$ 2,87, após enfrentarem leilões consecutivos devido à oscilação máxima permitida.

Einar Rivero, da Consultoria Elos Ayta, informou que a Gol viu seu valor de mercado encolher para R$ 1,2 bilhão. Cifra próxima ao valor de mercado da construtora Tenda (TEND3), que é de R$ 1,19 bilhão. Além disso, em 2024, a aérea acumulou perdas de R$ 2,55 bilhões, sendo R$ 444 milhões apenas no último dia.

No fechamento do Ibovespa, somente 10 ações do índice avançaram, destacou Rivero. A Suzano (SUZB3) liderou os ganhos, com alta de 2,56%, seguida por Carrefour (CRFB3) e Embraer (EMBR3). O Ibovespa encerrou o dia em queda de 0,86%, aos 127.401,81 pontos, na véspera da Super Quarta, quando se esperam decisões importantes de política monetária tanto nos Estados Unidos quanto no Brasil.

Por fim, com o mercado operando com cautela, as ações do setor de varejo foram pressionadas, tendo as da Casas Bahia (BHIA3) como uma das maiores baixas do dia.

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